Apesar da grande população de nikkeis residente em Curitiba ao longo de século XX, apenas da década de 1990 é que se teve a idéia de realizar na cidade os tradicionais matsuris, festivais japoneses que acontecem freqüentemente em comemoração a alguma data especial (dia das meninas, dos meninos, primavera, etc).
A idéia do primeiro Imin Matsuri (festival da imigração), realizado em junho de 1991, foi sugerida por Seto (2007), ao então presidente do Nikkei Clube localizado no bairro do Uberaba em Curitiba, Rui Hara. Na época eram realizadas inúmeras rifas com o intuito de arrecadar fundos para bancar as viagens das várias equipes de esportistas, principalmente beisebol, que treinavam no clube. O matsuri foi realizado no ginásio do local e reuniu várias entidades e departamentos do Nikkei com o intuito de ajudar todos a arrecadar verbas para cobrir despesas de suas próprias atividades.
O festival nada mais foi do que uma renovação da festa junina que era realizada anualmente pela entidade. Várias atividades, como o correio elegante e a eleição da mais bela sinhazinha foram substituídas por adaptações de costumes dos matsuris japoneses. Rosa Osaki, diretora social da época e Rui Hara concluem que os tanzaku, cartões nos quais os japoneses escrevem poesias e pedidos de graça, seriam os novos mensageiros para os apaixonados e Seto faz uma adaptação missigenada da Lenda da Tanabata para que então pudesse ser eleita, no lugar da sinhazinha, a “Rainha da Tanabata”. Além disso foi feita uma réplica do Kasato Maru com o intuito de resgatar a história da imigração.
A idéia era fazer uma réplica do navio Kasato Maru, que seria montada em uma carreta e introduzida no auge da festa. Como isso era praticamente impossível devido as escadarias do ginásio de esporte do Nikkei, se optou por montar uma fachada cenográfica do navio diante o palco. (INFORMATIVO IMIN MATSURI 2003, p. 24).
A festa cumpriu sua função primordial, que era a de resgatar a cultura dentro da sociedade nipônica, uma vez que muitos não sabiam com exatidão da história da chegada dos imigrantes japoneses no Brasil. Devido ao sucesso do evento, em setembro do mesmo ano foi realizado o Haru Matsuri (festival da primavera) no mesmo local. Segundo o informativo do Haru Matsuri de 2003, tudo começou quando Hara decidiu criar a “semana cultural” durante a primavera. Com a ajuda de Seto e Osaki, eles criaram uma festa cheia de flores e misticismo, mais uma vez adaptando as atividades à realidade dos curitibanos.
Pegue um vaso florido e vá ao Nikkei. É Haru Matsuri – A Festa da Primavera. Na volta você trás seu vaso energizado, com bons fluídos do fussui (Feng Shui em chinês), essa energia vai garantir paz e harmonia no seu lar até o início da próxima Primavera. (INFORMATIVO HARU MATSURI 2003, p. 24).
O Gohei trata-se de uma espécie de espanador usado em cerimônias religiosas de origem Shinto para afastar energias negativas, e sua utilização é comum nos matsuris japoneses.
Os festivais passaram então a serem realizados anualmente nos meses citados acima e em pouco tempo tomaram uma proporção maior do que o clube poderia suportar. Em 1993, já com dois dias de duração, o Imin Matsuri foi realizado na Praça do Japão, ano no qual o “Memorial da Imigração Japonesa” foi inaugurado. O prefeito da época, Rafael Greca, propôs para a presidente da Fundação Cultura de Curitiba Alice Ruiz a construção do “Templo do Haikai”. Ela e Seto elaboraram um projeto que foi encaminhado para o então secretário do Meio Ambiente Hitoshi Nakamura, que com sua equipe construiu um edifício inspirado no Kinkakuji, também conhecido como Pavilhão Dourado, localizado em Kyoto.
Com os festivais crescendo rapidamente, os organizadores notaram que a praça do Japão não possuía espaço suficiente para receber os visitantes de maneira satisfatória. Sendo assim, o Haru Matsuri de 1993 foi realizado no Parque Barigui, fato que desagradou um pouco o prefeito da época. Seto (2007) conta que o prefeito havia criado a praça para que a comunidade nikkei pudesse realizar os matsuris em um espaço propício e por esse motivo a maioria das festas posteriores aconteceram na praça do Japão.
Ambas as festas sempre foram envolvidas de misticismo e simbologia, muito embora nem todos os visitantes se dêem conta disso. Ao longo dos anos foram inseridas várias lendas e costumes, entre eles a escolha da Deusa do Matsuri.
Matsuri é a palavra japonesa para designar festa ou festival. Originalmente significa “ato de oferendar coisas aos deuses” na tradição Shintô (religião nativa do Japão). Isso subentende que não existe matsuri sem uma divindade. Por isso é comum no matsuri do Japão, pessoas carregando o Omikoshi, que é um altar portátil, onde está a divindade daquele festival. O Omikoshi é carregado pelas ruas para espantar maus espíritos e fazer varredura de todos os males, como doenças, fome, catástrofe, etc. (PLANETA ZEN, 2005, p. 4)
Seto (2007) conta que quando era pequeno sempre ficava encantando com os homens saindo dos matsuris carregando os omikashis e andando pelas ruas da cidade, fazendo uma grande festa para espantar os males. Sendo assim, para que a festa seja abençoada, é feita a escolha simbólica da Deusa do Matsuri, que pode variar durante o ano.
São distribuídos durante as festas informativos descrevendo um pouco da história dos matsuris, além de lendas japonesas e notícias sobre a comunidade nikkei. Outra maneira de resgate cultural realizado durante os eventos é o uso da Moeda Matsuri, que nada mais é do que um dinheiro interno que pode ser comprado nos caixas e depois trocado por comidas, sendo muito mais higiênico e colaborando no controle financeiro interno dos festivais. São impressas notas coloridas de 0,50 imin, 1 imin, 2 imins, 5 imins e 10 imins, cada qual com uma imagem que remeta ao tema do matsuri.
No ano de 2005, já tendo os matsuris conquistado o posto de maior feira gastronômica de Curitiba, é criado o Hana Matsuri (festival das flores, ou ainda o Natal de Buda), em comemoração ao nascimento do primeiro Buda. Reza a lenda que logo após nascer, andou sete passos, apontou a mão direita para o céu e a esquerda para a terra e disse “eu sou meu próprio senhor entre o céu e a terra”. Além disso, no momento do seu nascimento “a terra tremeu e a chuva de néctar caiu do céu, abrindo todas as flores do jardim de Lumbini”. (INFORMATIVO HANA MATSURI 2005, p. 12)
Neste mesmo ano os matsuris mudaram-se para espaços maiores, uma vez que o público recebido já ultrapassava 35 mil pessoas, segundo Seto. O Hana Matsuri e o Haru Matsuri foram realizados no Museu Oscar Niemeyer, restando apenas o Imin Matsuri na praça do Japão. Já em 2006 todos os festivais aconteceram em locais mais amplos, sendo que apenas no Hana Matsuri de 2007, o último promovido até a conclusão deste trabalho, voltou para a praça. Nessa ocasião, o festival contou com a presença de aproximadamente 40 mil pessoas e a participação de 39 entidades independentes do Nikkei Curitiba e 21 departamentos do clube.
A presença dos jovens no evento é bastante significativa e incentivada pelos organizadores. Se por um lado os festivais têm como princípio a manutenção da cultura tradicional japonesa na comunidade nikkei, por outro estão abertos para as diversas demonstrações da cultura pop, seja por descendentes ou não.
O verbo transgredir é cada vez mais praticado nos matsuris de Curitiba. As pessoas deixam as mesmices de lado, vestem como querem e vivem suas fantasias esquecendo obrigações diárias, os estresses, o trânsito e os chatos que nos rodeiam. No próximo matsuri, transgrida e seja feliz você também. (PLANETA ZEN, 2005, p.4)
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